quarta-feira, 23 de julho de 2014

[FLOR E SER]


Ser flor
É segurar a dor do parto no caule.
Ter tronco de lágrima caída
tão doída que jamais se foi.

Ser flor é também ser fruta
Truta fresca sem tempero
Cheiro e sabor
que se medra e não se entende.

É ter olhos fundos da noite
E balançar na manhã que avisa.
É boca seca:
silêncio afoito
calado na beleza.

Ser flor
tem um pouco de tristeza
Da antecipação de figurar o amor de outrem
De morar em vasos de água fria
postos no alto
de um lar alheio ao ar
e ao chão de terra.

É ter vida curta
E relevância de pétalas.
É não saber-se completa
No meio de um buquê.
É ser sem porquê
À serviço de quem
não se presta a olhar o não-belo.

Ser flor é mero
presente.
Ou mora
em memória
Ou em
jardim
Ou em cima
da gente.

Ilustração: Gabriel Araújo

domingo, 6 de julho de 2014

[AMOR DE LONGE]


Há amantes
Que na distância o são integralmente.
Sem descanso, intervalo ou distração.
Há os amantes que o são
Sem dias vãos,
sem se permitir
O despeito de não amar
- de amar menos;
amar ameno,
com pouco calor no coração.

Há amantes grandes.
Pequenos no jeito de amar no silêncio.
Olhando qualquer paisagem,
na ida e vinda da viagem
curta-metragem de personagens
sem nexo
perplexos
de existirem
na inexorabilidade da vida.

Há amantes que o são sem vergonha
cheiro de fronha
que se abraça,
mãos no regaço
sem pressa de que o tempo passe,
pedido que não se despeça
certeza de seguir no passo.