domingo, 10 de setembro de 2017

[NÃO TER A VERGONHA DE SER]



Não sei o nome do meu anjo, mas sei que ela existe. E é mulher. Pra mim é meio que espelho, nem feio nem bonito, apenas podendo refletir tudo o que eu sou e do que me aproprio. Meu anjo incansávelmente trabalha. Muito frequentemente me diz em palavras mais angelicais que as minhas que “poderia ser pior”. É tão estranho estar na cozinha batendo ovos para o omelete e escutar de repente meu anjo me dizendo isso, palavras que chocam de frente com meus pensamentos – longe das chamas do fogão. É um embate que chega a ser injusto, porque minha indecisão, tristeza, dúvida, cansaço nunca tem chance de ganhar. Sentimento que fica estatelado ali no peito, com cara de pouco, com cara de bobo, com cara de que não merece atenção. Então eu sigo pensando em coisas melhores, lembrando de dias mais lindos, lendo coisas que me elevam a consciência, vendo o mundo através. Mas o mau agouro não me deixa um dia. E sempre vem bater ali, no mesmo lugar, fazendo cansar, às vezes chorar, mas nunca preparado pra o que diz o meu anjo. Pra o que nele faz de mim, um eu de músculos, carne, osso e pele, poderoso em si, sem nem saber a quem deve a graça de ser feliz.


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Ilustração: Maya Shleifer

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